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Ruínas: o descaso com a “Casa da Cultura” de Parintins/Am

Atualizado: 23 de fev.

A mercê do Poder Público, Casa da Cultura está largada aos ratos há mais de 25 anos


Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura
Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura


Falar de Cultura em Parintins sem mencionar a “Casa da Cultura” é fechar os olhos também para o descaso. Será o "Templo dos excluídos da cultura" ou “Casa da Cultura e da Corrupção”? Assim escrito por artistas nas paredes das ruínas.


As problemáticas do complexo “Casa da Cultura Alzira Saunier” existem desde 1996, em Parintins. Movimentos sociais idealizaram e solicitaram projetos de revitalização, mas, até o momento, “não há respostas”.


Um olhar a partir da rua Nações Unidas, no Centro de Parintins (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
Um olhar a partir da rua Nações Unidas, no Centro de Parintins (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

Clamor da cultura marginalizada por meio da arte: um poema por Aldair Marialva de Souza. O texto está com pouca visibilidade (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
Clamor da cultura marginalizada por meio da arte: um poema por Aldair Marialva de Souza. O texto está com pouca visibilidade (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

“É uma casa muito engraçada é a Casa da Cultura de Parintins”, não tem teto e nem estrutura para fazer jus ao nome que carrega. Em tom irônico, essa frase entre aspas no muro externo da ruína, chama atenção do público na rua Nações Unidas.


Na parede das ruínas está escrito: "É uma casa muito engraçada, é a casa da cultura de Parintins", a fazer uma comparação com a música "A Casa", de Sergio Bardotti e Vinícius de Moraes (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
Na parede das ruínas está escrito: "É uma casa muito engraçada, é a casa da cultura de Parintins", a fazer uma comparação com a música "A Casa", de Sergio Bardotti e Vinícius de Moraes (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

Teia de Culturas é mais um, entre tantos apelidos da Casa da Cultura (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
Teia de Culturas é mais um, entre tantos apelidos da Casa da Cultura (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


Enquanto nos muros exteriores da rua Domingos Prestes, vindo da periferia rumo ao centro, a primeira frase que vejo: “se a cultura aqui funcionasse, desaculturados não faziam lixeira deste lugar”. O que de fato tem muito a ver com o ambiente, muitos lixos espalhados por toda parte, principalmente, nesse módulo, o fedor é horrível.


"Se a cultura aqui funcionasse, desaculturados não faziam lixeira deste lugar", é mais uma frase de reivindicação nas paredes das ruínas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
"Se a cultura aqui funcionasse, desaculturados não faziam lixeira deste lugar", é mais uma frase de reivindicação nas paredes das ruínas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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Casa da Cultura, na margem da rua Domingos Prestes, no Centro de Parintins (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


Diferente do que podem dizer, os manifestantes não concordam e nem incentivam a “lixeira viciada”. Evidenciam problemáticas a partir das críticas, repreendem o Poder Público pelo descaso e conscientizam as pessoas desprovidas de bons modos que se distanciam da própria identidade cultural quando decidem despejar lixo no local.


Lixo entre as ruínas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
Lixo entre as ruínas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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Pintura de uma indígena e de um cachorro para dizer que aqui tem vidas e elas importam (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


O jovem Adriano, 23, fala sobre o descaso com a Casa da Cultura, que o espaço serve para uso de drogas: “Já usei drogas aqui, mas hoje em dia não uso mais. Agora estou tentando ganhar dinheiro com vendas de sal, depósito e frigideira. Comecei a vender hoje, vou ficar aqui até às 21h”, revela.


Sobre o uso de drogas nas ruínas, avistei alguns usuários na área interna na minha primeira visita. Em plena luz do dia, num clima pós-chuva, de longe olhavam de vez em quando, apenas colocavam o rosto para fora. Num instante, devido à minha presença, com o olhar desconfiado, um deles saiu para observar. O intuito não era intimidá-los nem expô-los.


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Adriano posa para foto após entrevista no dia 22 de julho de 2022, na Casa da Cultura. Ao sair da rua Domingos Prestes rumo à rua Nações Unidas, depois de avistar os usuários de drogas dentro da ruína, encontrei esse jovem que fez questão de conversar comigo. Fiquei curiosa; pensei que morava no lugar, mas, segundo ele, estava lá por conta das vendas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


Sobre o uso de drogas nas ruínas, avistei alguns usuários na área interna na minha primeira visita. Em plena luz do dia, num clima pós-chuva, de longe olhavam de vez em quando, apenas colocavam o rosto para fora. Num instante, devido à minha presença, com o olhar desconfiado, um deles saiu para observar. O intuito não era intimidá-los nem expô-los.


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Um olhar a partir da rua Senador Álvaro Maia para dizer que, na área interna da ruína, na direção esquerda, estavam os usuários de drogas. Ao fundo, é possível observar um pedacinho do Bumbódromo em contraste com a Casa da Cultura (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)



História da Casa da Cultura


A Casa da Cultura Alzira Saunier era um prédio inacabado da biblioteca municipal Vera Lúcia Simplício, abandonado durante os anos de 1996 e 1997, entre as gestões dos ex-prefeitos Raimundo Reis Ferreira e Carlinhos da Carbrás (falecido em 2012).


De acordo com o Portal da Transparência do Governo Federal, foram liberados R$ 400 mil, em 1993, pelo Ministério da Cultura, para implantação e ampliação do que seria a Casa da Cultura.


(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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Retratos atuais da Casa da Cultura (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)



Movimento Parintins Sem Fantasia


Em 2013, os movimentos sociais se uniram em prol a revitalização da Casa da Cultura de Parintins. Tudo começou com uma assembleia na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), com parcerias de diversos setores da arte e universidades públicas locais.


E, aos exatos 22 de agosto de 2013, Dia Nacional do Folclore, na gestão do ex-prefeito Alexandre da Carbrás, houve o primeiro ato público. Durante a noite, retiraram as placas de publicidade que “escondiam” a obra inacabada, em boas condições na época.


Na primeira ocupação, intervenções inteligentes e pacíficas foram feitas por artesãos, artistas plásticos e músicos. E assim surgiu o Movimento Parintins Sem Fantasia, que reuniu os movimentos populares Articulação Parintins Cidadã e Anarco-Punk, grupos de rock, Associação dos Artistas Plásticos de Parintins (AAPP), Liceu do Instituto Irapan e outros.


Assista o vídeo do professor Rafael Bellan (produzido por: Phelipe Marques Reis), que explica o propósito das primeiras manifestações: https://youtu.be/m0xms5nCkt4


Dia 30 de agosto de 2013, foi entregue ao ex-secretário de Administração, Dielson Canto Brelaz, comprometido passar ao ex-prefeito Alexandre da Carbrás, o documento construído pelo Movimento Parintins Sem Fantasia, que solicitava a conclusão da Casa da Cultura, com a exigência de ser utilizada para atividades culturais e não para outras finalidades.


Durante a visita do ex-governador Omar Aziz ao Bumbódromo, no dia 16 de setembro de 2013, o Movimento Parintins Sem Fantasia protestou sobre a centralização dos investimentos em cultura, devido aos R$ 50 milhões investidos na reforma do Bumbódromo. Nessa data, Parintins foi contemplada com o Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro.


Os ativistas tentaram solicitar Audiência Pública com Omar Aziz sobre a reforma da Casa da Cultura, mas não houve interesse em revitalizar o espaço, nem respostas acerca da recepção da pauta das reivindicações.


Estudantes, professores e pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas (Icsez/Ufam), movimento feminista e artistas em geral, que integravam o Movimento Parintins Sem Fantasia, foram taxados como “desqualificados” na época.


No período de 22 e 23 de outubro de 2013, o Movimento Parintins Sem Fantasia ocupou a Câmara Municipal para solicitar uma Audiência Pública com o ex-prefeito Alexandre da Carbrás sobre a Casa da Cultura. A audiência ocorreu no dia 29 de novembro de 2013, sem registros; não é difícil de imaginar o resultado.


De acordo com as postagens na página do Movimento Parintins Sem Fantasia, de 2014 a 2019, geralmente, em 22 de agosto, Dia Nacional do Folclore, aconteciam as comemorações de aniversário da ocupação na Casa da Cultura – com aulas públicas, exposição de artes, feira de quintais, mudas de plantas, artesanato, culinária regional e músicas. Intervenções artístico-culturais reforçavam as reivindicações sobre o descaso do prédio abandonado.



Além das celebrações no Dia Nacional do Folclore, a valorização do espaço ocorria o ano todo, em diferentes datas. Em 19 de dezembro de 2015, houve o concurso de livre expressão artística produzido nas paredes das ruínas, com o tema: “Natal Sem Fantasia”, no intuito de verbalizar, por meio da arte.


Dos 21 painéis inscritos, os ganhadores foram: em primeiro lugar, Arildo Mendes, com a arte: Meu Natal; em segundo lugar, José Augusto Tavares, com o painel: Memória da Corrupção; em terceiro lugar, Glaedson Azevedo, com o painel: Reflexo do (Des) Natal; e, em quarto lugar, Ivan Freitas (falecido em 2017), com a obra: Por que me abandonaste?


No mês de junho de 2017, durante o Festival Folclórico de Parintins, houve reocupação do movimento, com programações artístico-culturais: feira de quintais e intervenções artísticas. Lá, em 2013, no dia 15 de outubro, no aniversário de Parintins, também ocorreram atividades culturais: feira de artesanato, roda de capoeira, pista de skate, hip hop, apresentações musicais, etc.


As últimas intervenções artísticas aconteceram em 08 de março de 2020, no Dia Internacional da Mulher, organizada pela professora Fátima Guedes, líder do movimento feminista em Parintins, com a participação da Associação dos Artistas Plásticos de Parintins (AAPP).


(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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Manifesto do Dia Internacional da Mulher nas paredes das ruínas (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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Memória da Corrupção III (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


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Obra "Frida Kahlo" do Dia Internacional da Mulher (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


A luta do Movimento Parintins Sem Fantasia ia além da revitalização da Casa da Cultura; abordava temáticas: transparência do problema da lixeira, saneamento básico, investimentos em saúde e educação, transparência com o dinheiro público, entre outras.


As informações históricas do Movimento Parintins Sem Fantasia você confere na página do Facebook.


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Artistas dão vozes às ruínas por meio da arte, uma verdadeira manifestação de seus anseios (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)



“Casa da Cultura” e Bumbódromo: Lado a Lado


Parece ironia a “Casa da Cultura”, numa área nobre da cidade, em situação de abandono, ao lado do Bumbódromo, palco do Festival Folclórico de Parintins, onde a cultura local é exaltada e transmitida ao mundo em três dias de festividades.


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O contraste é para livre reflexão (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


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De um lado, o famoso descaso; do outro, o famoso Bumbódromo (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


Toda essa abordagem histórica de reivindicações comprova o abandono da Casa da Cultura pelo Poder Público em diferentes gestões, que, durante décadas, ignoram as problemáticas, sem apresentarem soluções e respostas positivas ao povo parintinense.


Os protestos, desde 2013, pediam continuação da obra, porém, faz tanto tempo de descaso que, agora, o ambiente precisa ser refeito. Parte das ruínas estão em risco de desabamento, como mostram as imagens desse ensaio fotográfico.


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Estrutura em risco de desabamento na área da rua Domingos Prestes (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)


(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)
(Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)

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As imagens falam por si (Foto: Larissa Monteiro/Amazonas Cultura)




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